Não fuja da luta, covarde

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Empate

quinta-feira, 7 de novembro de 2019

5 anos em V de novembro



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Virtude, Vida, Verdade, Vitória, Vingança
"Por baixo dessa mascara não existe um homem, existe uma ideia, e ideias são a prova de balas” V.

Queridos e queridas afilhados e afilhadas
Permitam que eu me apresente, sou um homem de riquezas e bom gosto, estou aqui há muito tempo, e roubei as almas e a fé de muitos homens. Prazer em conhecer vocês, esperoque saibam meu nome.
Decidi escrever esta carta em primeiro lugar como agradecimento pela homenagem e pela lembrança nesse momento tão importante da vida de vocês. Estaremos juntos naquele quadro que enfeitará o prédio da psicologia até o fim dos tempos
Em segundo lugar o mais importante: ainda estou tentando entender por que diabos vocês resolveram fazer isso...
Um de meus textos preferidos de Freud é aquele que trata do humor e das tiradas espirituosas, e de quanto é importante para rirmos de algo que façamos parte de uma mesma paroquia, que sejamos envolvidos por um enlaçamento social, ou seja, é claro que essa piada tem mais graça apenas para alguém que porventura leia essa carta e não faça parte de todo universo discursivo e relacional que compartilhamos.
De qualquer jeito, agora recorro às lembranças da minha formatura e de tantas outras até então e me dou conta de que há um certo perfil para professores homenageados: pessoas doces, queridas, suaves,que ministraram varias disciplinas ou conviveram com a turma por todo o percurso academico. Eu não me encaixo em nenhuma dessas categorias... aliás sou contra homenagens, minha frase preferida é de Marx, (Grouxo, o humorista): “eu jamais entraria para um clube que me aceitasse como sócio”. Vocês ,mais do que ninguém,sabem sou uma pessoa convencional e tampouco essa homenagem o é.
Partindo do pressuposto psicanalítico de que nossos objetos de desejo são mais da parte desejante do que da desejada, penso ser importante e até divertido interrogar: por que eu? Por que nós? Por que agora?
Deixem que eu conte para vocês como foram minhas primeiras experiências docentes. A primeirissima vez que entrei em sala de aula como professor foi quando uma professora da UFRGS foi para os Estados Unidos celebrar o casamento da filha e confiou a mim as 8 ultimas aulas de Psicologia da Comunicação para uma turma de jornalismo e RP. Não sabia absolutamente nada da matéria, mas aceitei por uma simples razão, que agora surge como tema desta carta: eu tinha um sonho. Como vocês mais do que ninguém sabem, eu sou uma pessoa que vai direto ao ponto e no primeiro encontro com a turma eu realizei um sonho antigo de dar a aula em pé em cima da mesa, igualzinho ao meu filme preferido, o qual tenho certas duvidas se é muito atual ou ultrapassado “Sociedade dos poetas mortos”
Naquela segunda feira de março de 2015 eu também entrei na sala ansioso e cheio de esperança nervosa, afinal, nunca havia ministrado História da Psicologia, e também nunca tinha encarado uma turma de primeiro ano de nosso curso.
Eu lembro como se fosse hoje daqueles 100 olhos me fuzilando ( essa piada eu contei naquele dia, lembram?) cheios de vontade de aprender, e eu, sem nenhuma ideia de ensinar. Lembro agora que eu fui orador da minha turma no ensino médio e meu discurso só não me levou a expulsão porque era o dia da formatura. Entre o fim do colégio e os primeiros anos da faculdade fiz quatro anos de teatro, Eu sempre gostei de provocar reações nos outros, e ás vezes considerava a turma como se fosse minha platéia. Eu chegava na aula com meu livro do Nietzsche embaixo do braço e quando eu resolvia falar era para desconstruir tudo o que se dizia na aula.
E é de meu filósofo preferido que retiro a lição que nos interessa aqui, que é que todo mestre só sabe daquilo que diz respeito a discípulos, o que leva o sábio Zaratustra a dizer aos seus “não me sigam, escondam-se de mim, envergonhem-se de mim”.
Vocês sabem como isso funciona, e, como eu nunca havia visto em minha vida de docente, abraçaram esse paradoxo de seguir um guru sem delegar-lhe o poder da verdade, de apostar no desejo de saber jamais satisfeito no desejo de desejar. Diz Nietzsche em um poema que “ a verdade ama os guerreiros (ou guerreiras)”, assim como Sócrates se insurgiu contra os filósofos cínicos que vendiam a verdade a dinheiro, com seu método de dúvida vertiginosa e seu aforismo “só sei que nada sei”
Mas enfim o que nos faz professores? Eu recorro a meu livro de cabeceira, que foi-me apresentado pela vela na minha escuridão, mestra, mãe, amiga que saiu de minha vida como um membro amputado: Tania Galli Fonseca. O livro é do filósofo Jacques Ranciere, “O mestre ignorante” E ali ele fala que o professor jamais deve ensinar e não há aluno que não saiba. A lição aqui é de emancipação intelectual, de Hegel: professor e aluno precisam se libertar
O conhecimento não está em lugar nenhum senão entre nós, vínculos, sentimentos, cumplicidade.
Agora, o que eu, que encontrei vocês no começo, estou aqui novamente, no fim? Por que agora?
Todo mundo sabe que uma longa noite sobre nós, nosso Estado, nosso povo, nossas famílias e nossos modos de existir.
Vivemos um tempo de guerra, e uma guerra de verdade e de Verdades

E nada melhor do que sermos guerreiros amados por essa Deusa tão sedutora, e podermos dançar com ela.
Lembrei agora de um antigo mito hindu, que trata de uma divindade dançarina chamada Shiva, cujo bailado dá início e fim ao Universo. Shiva nos diz que tudo o que começa termina, o que morre vive e o que é criado precisa ser construído para ser criado novamente.
E aqui estamos nós em nossa dança, no início e no fim, quando eu destruí as esperanças de vocês em aprender Psicologia e vocês reconstruíram o meu desejo de ser professor
Ademais, os Hindus, como outras culturas, acreditam que o mundo é um sonho que foi sonhado pelas divindades, assim como eu me aproprio das palavras de João Grilo no Auto da Compadecida para dizer quem eu sou “Apenas um homem que foi sonhado por Deus” e entrego a vocês agora colegas como presente para sonhar o futuro a musica de ChicoScience: Adeus

Ah, antes de ir embora eu gostaria de contar uma piada, que me foi contada por um amigo chamado Arthur Fleck, grande palhaço e comediante, alguém como eu:
Tinha dois caras num hospício, uma noite eles decidiram que não iriam viver mais lá, e resolveram fugir. Foram até a cobertura do asilo  e viram ao lado, o telhado de um outro prédio apontando para a lua, apontando para a LIBERDADE.
 Então um dos sujeitos saltou sem problemas para o outro telhado, mas seu amigo se acovardou. Ele tinha medo de cair, sabe. O primeiro cara teve uma ideia. Ele disse:"Ei, estou com a minha lanterna, vou acendê-la sobre o vão  dos prédios e você atravessa pelo facho de luz. 
Mas o outro sacudiu a cabeça... e disse..."o quê? você acha que eu sou LOUCO? E se você apagar a luz quando eu estiver no meio do caminho"?


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