Não fuja da luta, covarde

Não fuja da luta, covarde
Empate

quinta-feira, 3 de agosto de 2017

A Democracia dos Campeões

Sou um frequentador apaixonado do centro de Porto Alegre ,que hoje os eufemismos da gentrificação chamam de "centro histórico" algo que não é centro (fica na beira do rio) e não é o único lugar "histórico" de minha cidade. A ironia é um apanágio fundante gaúcho, e , por ela, nunca entrei em um de meus lugares preferidos da cidade: uma loja de troféus da Galeria Chaves. Eu passo em frente a loja quando quero acesso rápido da Andradas ao Mercado Público e sempre fico preso aos mesmos devaneios de como seria entrar ali e comprar um troféu para mim mesmo;Cheguei até a rascunhar em meus pensamentos o roteiro de um curta-metragem no qual um sujeito desiludido com a vida encontraria a solução definitiva para sua melancolia comprando uma medalha, uma taça ou uma estatueta dourada.
Pensei até no título "Auto estima: felicidade em três parcelas".
Mas desde ontem resolvi mudar o título para "Democracia brasileira como eu me lembro".
Ora, é claro que é um grande delírio pensar que eu seria um campeão comprando um troféu, afinal, para ganhar algo é preciso merecer: escrever alguma obra relevante, vencer um campeonato, enfim, destacar-se em alguma competição ou concorrência, fazer por merecer, conquistar, galgar degraus...
Quando os parlamentares brasileiros decidiram que esse país seria uma democracia a Assembléia Constituinte se reuniu e elaborou um dos documentos mais complexos e abrangentes da história brasileira, a Constituição de 1988, que instalou no Brasil um imenso software de democracia a ser utilizado por milhões de usuários que mal sabiam ligar seus computadores na tomada, ou retomando a metáfora do troféu, entraram em um campeonato no qual não sabiam nem as regras de inscrição.
Desde Fernando Collor de Mello a democracia Brasileira foi descobrindo as regras com o campeonato em andamento: de um lado a população e os movimentos sociais lutando pelas garantias de direitos e do outro os verdadeiros donos do país, as velhas capitanias hereditárias. 
Lembro do filme "Carruagens de fogo", sobre os atletas que disputaram a primeira Olimpíada da era moderna, sem saber exatamente o que era essa competição e acreditavam na máxima do barão de Coupertain "o que interessa é competir".
Nas Olimpíadas de hoje há pouco espaço para a surpresa, o amadorismo, os grandes heróis. O jogo é jogado estritamente pelas regras, pelo preparo, pelo inexorável poder econômico das nações. 
Assim como na política. 
Os profissionais da política agora dominam as regras do jogo e ganham todos os troféus, e descobrimos os poderes ilimitados da democracia capitalista: crimes de corrupção são julgados politicamente, o presidente indica ministros do supremo que irão julgá-lo e estes mesmos são sabatinados pelo congresso nacional, que decide se o presidente pode sofrer impeachment.
Sim, meus amigos, o cristianismo dominou o mundo por dois mil anos com um livro que foi lido por 10 por cento dos cristãos.
O que vimos ontem foi o exercício pleno da democracia, por quem aprendeu a ler o regulamento da competição.

5 comentários:

  1. Caro. Delicioso texto! Mas não me furto a meter a colher. A questão não é que uns conhecem as regras - lembrando Ferdinand Lassalle, no "O que é uma constituição política?" -, mas que ele$ FAZEM as regras: as descumprem, as interpretam, as transformam, as inventam... sempre de acordo com as relações de forças. Um forte abraço. JMário

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. De fato, mas penso que agora esteja, cada vez mais a vontade para faze-lo...

      Excluir
  2. Sim. Despudoradamente - perderam o pouco pudor que ainda restava!

    ResponderExcluir
  3. Muito bom Fábio! Parabéns! Continuemos esperançosos...

    ResponderExcluir
  4. Parabéns pelo texto professor! Muito coerente!

    ResponderExcluir